O ínicio do culto em busca da forma física perfeita surgiu na Grécia antiga, quando a preocupação com o físico era de extrema importância para os gregos, que buscavam ter capacidade intelectual e física tendo como lema “mens sana in corpore sano (mente saudável em corpo são).

Com o passar dos anos, o conceito de beleza e saúde foram se alterando. Atualmente, o crescimento da mídia fez surgir a indústria da beleza, incutindo novos padrões de beleza à sociedade, tornando-se uma obsessão em todo mundo; principalmente nas classes mais ricas. Hoje, cada vez mais pessoas buscam formas de transformar o físico, em busca da perfeição de acordo com os padrões ditados.

Essa intensificação do culto à estética trouxe danos notórios para a sociedade: doenças como anorexia, bulimia e vigorexia (prática de exercícios físicos em excesso) são mais frequentes do que se imagina. Muitos colocam suas vidas em risco, consumindo remédios para emagrecer e anabolizantes ou até mesmo fazendo cirurgias desnecessárias.

Isto também está acontecendo em relação ao sono. Um novo distúrbio surgiu da busca de uma noite de sono perfeita, a “Ortosonia”, com ‘orto’ significando correto, e ‘sonia’ significando sono” – e está afetando pessoas obcecadas com os resultados do sono e rastreadores de fitness. De acordo com estudo publicado no Journal of Clinical Sleep Medicine (http://dx.doi.org/10.5664/jcsm.6472), e tema de palestra na conferência “Brain 2019”, que aconteceu este mês em Brasilia, o uso de dispositivos de rastreio do sono (sleep trackers – Fitbit, Apple Watch, Nike Fuel Band, Jawbone Up, etc) está rapidamente se expandindo e oferecendo oportunidade para envolver os indivíduos no monitoramento de seus padrões de sono. No entanto, há um número crescente de pacientes que procuram tratamento para distúrbios do sono autodiagnosticados, como duração insuficiente do sono e insônia, devido a períodos de sono leve ou agitado observados nos dados do rastreador do sono.

Baseando-se apenas nos dados de seus rastreadores, as pessoas estão se convencendo de que sofrem de um distúrbio do sono, mesmo quando não estão. O resultado subsequente são pessoas que estão ficando obcecadas em ter uma noite de sono “perfeita”. Para os pacientes, os dados do rastreador do sono geralmente parecem mais consistentes com sua experiência de sono do que as técnicas validadas, como polissonografia ou actigrafia, o que não foi ainda comprovado na literatura científica.

Em vez de confiar em seus corpos, e em como se sentiam quando acordavam todas as manhãs, constatou-se que os pacientes dependiam muito de seus rastreadores de sono para lhes dizer se tinham conseguido um sono reparador ou de qualidade.

De acordo com a Fundação Nacional do Sono, os adultos normalmente precisam de sete a nove horas de sono por noite, dependendo de uma série de fatores e variando para cada pessoa. Se você acordar sentindo-se revigorado e acordado, você normalmente teve uma boa noite de sono – apesar do que um rastreador de sono pode lhe dizer.

A preocupação é que, em vez de serem úteis, os rastreadores do sono podem estar reforçando a “ansiedade ou o perfeccionismo relacionados ao sono”, um “efeito colateral” destes aplicativos.

Como o uso desses dispositivos está se expandindo rapidamente entre nossa população, o desafio para os médicos é equilibrar a educação dos pacientes sobre a validade desses dispositivos (até o momento, os apps não substituem avaliações “padrão-ouro”, como a polissonografia) com o entusiasmo dos pacientes por dados objetivos.

Então, acredito que ainda vale aquele ditado: “Bom senso e caldo de galinha não fazem mal a ninguém.”

Valorize o seu sono…. Com sabedoria e na medida certa!

Até a próxima!

Fonte: Baron KG, Abbott S, Jao N, Manalo N, Mullen R. Orthosomnia: are some patients taking the quantified self too far? J Clin Sleep Med. 2017;13(2):351–354.

Sono e Smartphones. Gabriel Natan Pires. Brain Conference 2019