Eu sei que já existe um texto semelhante que diz quase o mesmo que vou dizer agora. Mas, peço licença. Eu preciso repetir a mensagem do meu jeito. Porque é algo que incomoda e faz sofrer.
Como a banana.
Quando você encontra uma pessoa que é alérgica a camarão, por exemplo, você não obriga essa pessoa a comer camarão, certo?
Certo.
Os rótulos das comidas hoje em dia vêm repletos de avisos quanto ao glúten, à lactose, ao transgênico, à quantidade de calorias, à gordura trans.
E se você recebe na sua casa uma pessoa que é intolerante à lactose ou alérgica ao pão de trigo, você não vai oferecer nada disso, ok?
Okay.
Quando alguém da sua família tem asma, geralmente o que se faz? Tira os ursos de pelúcia do quarto. Substitui tapetes. Evita cobertas peludas. Evita situações que façam levantar poeira. Repele ácaros e bactérias do ambiente. Ninguém vai querer ver uma pessoa passando por uma crise horrível de asma.
Se o seu avô tem diabetes, você obviamente não vai comprar um bolo de chocolate para tomar um café da tarde com ele. Né?
Pois então.
Pergunto: por que meu filho tem obrigação de suportar cheiros os quais não suporta? Barulhos os quais não aguenta? Lugares aos quais tem aversão?
É assim que as pessoas tratam um autista.
As pessoas acham que se eu não forçar meu filho a enfrentar multidões, ele não vai conseguir “vencer na vida”. Que se eu não obrigar meu filho a entrar na cozinha, ele nunca vai vencer sua hipersensibilidade olfativa. Que se eu não fizer com que meu filho sente-se à mesa como qualquer pessoa e encare um prato de comidas encostadas (sim, grande parte dos autistas têm aversão a comidas que estejam encostadas umas nas outras), ele não vai superar suas dificuldades.
Porque meu filho é………… fresco. Manhoso. Mimado. Mal educado.
“Ele está abusando”, disse uma profissional que deveria estar ali para ampará-lo e não para julgá-lo.
Mas, infelizmente, é o que acontece na maioria dos casos: julgam.
Porque, ao invés de ficar com o corpo todo empipocado, o que ele sente é dor e mal estar. Como provar para alguém que, por causa de um cheiro, você está com uma dor de cabeça terrível? Náusea? Tontura? E, pela dificuldade em explicar tudo o que acontece ao mesmo tempo no seu cérebro, muitas vezes ele chora. E é proibido que um garoto de 13 anos chore.
Meu filho não consegue entrar em um lugar onde tenha uma banana.
Uma banana ativa áreas do seu cérebro completamente diferentes do que ativaria em uma pessoa comum. Uma pessoa comum poderia sentir fome, desejo, poderia até salivar, de acordo com a relação que tem com a fruta.
No caso do meu filho, ele sente um nojo profundo. Seu cérebro aciona “alarmes” de perigo, nojento, tóxico, não se aproxime! E ele tem as reações típicas de alguém que vê, por exemplo, um prato de uma comida podre, cheia de larvas: faz ânsia, vomita. E como está cansado de ser repreendido por isso, sempre que acontece, acaba entrando em desespero. Sente-se culpado. E vem o peso do julgamento e do autojulgamento: como posso ser capaz de sentir isso por uma comida?
Mas ele não tem controle. Não faz porque quer, mas porque seu cérebro funciona assim, mesmo que digam que está errado. Assim como faz o pâncreas no caso de um diabético.
Grande parte dos autistas – e mesmo uma boa quantidade de pessoas sem diagnóstico algum – tem o que é chamado de transtorno do processamento sensorial (TPS). Seu cérebro recebe e responde a estímulos de uma forma inesperada. É como se os neurônios entendessem azul quando se diz vermelho.
Então, por favor, quando você perceber que uma pessoa com autismo tem essas dificuldades sensoriais, fica apenas uma dica: NÃO OBRIGUE.
Obrigada.
Olá Giselle!
Tenho um filho com TPS que foi diagnosticado no espectro do autismo com 1 ano e 11 meses. Ninguém sabe ao certo se é apenas TPS ou autismo também. Uma das principais dificuldades dele é com relação às comidas. O que tem em comum com seu filho, odeia bananas. A alimentação dele é muito seletiva devido às questões sensoriais: tátil, oral e visual tornam cor, textura, sabor e temperatura difícil de lidar. Acompanho os estudos referentes às questões sensoriais, especialmente os conduzidos pela Elysa Marco na UCSF, bem como redes sociais para entender melhor o tema como “parent zone”, “lemon lime adventures”, “star center institute” e “coming to my senses”. Já consegui alguns avanços mas a passos de tartaruga.
O mês de outubro é dedicado à conscientização sensorial.
Indico:
https://www.spdparentzone.org/product/sensory-awareness-month-online-conference-for-parentscaregivers/?mc_cid=bd1df3fc25&mc_eid=e4486fe5a7
Oi Salete! Obrigada pela sua presença por aqui! E muito obrigada pela indicação. Gostei muito. Quanto às questões relacionadas ao seu filho, é bom ficar atenta para os detalhes.
Essas questões sensoriais são um fator importante que causam um sofrimento imenso ao indivíduo e geralmente estão muito ligadas ao autismo, sim, já que é a organização neuronal da pessoa com autismo que vai refletir no TPS. E também é sempre bom lembrar que vamos ter os dois extremos: os que são extremamente sensíveis e os que praticamente não têm sensibilidade alguma (chegam a não sentir dor). E, dentro da reta entre esses dois pontos, uma infinidade de indivíduos, certo?
O autismo, por sua vez, vem acompanhado de uma série de outras questões que vão além do sensorial e envolvem a comunicação, as relações sociais e os comportamento e interesses. Enfim, creio que você já deve estar bem familiarizada com tudo isso, mas, se quiser trocar mais informações, pode contar comigo. 🙂
Um grande abraço a você e a seu filho!
Olá Giselle!
Fico feliz em saber que gostou da indicação.
Você tem algum e-mail para trocarmos mais informações?
Obrigada!
Oi Salete! Sim: você pode escrever para livreverso@gmail.com 🙂
Gostei muito do texto! Tenho um filho asperger que também tem TPS. Ele é do tipo que tanto foge de algumas sensações como busca outras. Quanto ao que ele foge, tanto eu como minha esposa respeitamos, mas o problema reside nas coisas que ele busca. Ele se comporta como um bebê na fase oral (embora tenha 9 anos). Nosso medo é que ele se machuque, se intoxique, ou as duas coisas. Sem contar com o risco de engasgo. Tentamos colocar as coisas fora do seu alcance mas ele sempre dá um jeitinho. Tentamos até com um mordedor, mas não deu certo porque parece que ele gosta de diferentes texturas. Ele mastiga praticamente tudo! Confesso que tenho muito medo. Estou aberto a sugestões.
Muito obrigada pelo texto ,,,bem explicado …