Eu já fui insustentavelmente pesado e já carreguei peso demais. Descobri que meu peso não era demasiado. O que estava insustentável não era meu corpo, pois meu corpo é lugar, porto e farol de encontro comigo mesmo e com o mundo. O mal, aquilo que fazia pesar estava no quanto eu carregava do mundo nas minhas próprias costas e isso me prejudicou os joelhos e ombros, me fazendo subitamente adoecer e consequentemente cair. Meus sentidos estavam enfraquecidos e meus desejos eram ausentes de sabor. Eu comia por comer, mas por incrível que parecesse eu comia muito, comia por medo, comia por sofrer e sofria por ter comido tanto. Eu comia pelo tudo ou nada, comia pelo vazio que havia em mim e que eu tinha me tornado.
Essa é uma parcela de culpa, parte da pena ou dívida com o mundo que eu criei e resolvi pagar sem ter sido julgado, sem nem ter sido tratado por nenhum sistema judiciário, apenas o mais infalível, o sistema moral. Digamos que o tal superego me superou, pois Eu consumia e consequentemente não me consumia. Estava atravessado por forças que não me deixavam sentir, ou talvez me diziam que era errado sentir. Me tornei um ser cansado de existir e acostumado a sofrer, com dificuldade de pensar. Basicamente posso dizer que viver estava demais pra mim. Independente da vida que eu estava produzindo, ainda era a minha vida, e isso me trazia responsabilidades, logo, eu tinha em minhas mãos, uma carga muito potente de medo e insegurança por ter que fazê-la dar “certo”. Ter uma vida ideal nos torna escravos da nossa própria existência. Pergunto quem aqui não se sente acabado e com uma imensa vontade de voltar a ser criança?
Eu quis me enxergar de cara limpa desenhar meu próprio rosto, para pelo menos saber o que estava acontecendo comigo. Diante de bons motivos eu criei coragem, percebi que só havia o chão, mas que se eu mudasse meu foco haveria o horizonte e também o céu. Então subitamente me levantei e olhei a minha volta. Eu só enxergava espelhos e a permanência dos reflexos do medo. Sentia o aprisionamento da alma e do corpo em coisas que não eram mutáveis, que estavam estagnadas, por processos de deterioração dos sentimentos. Aqueles bons motivos que antes citei, se fizeram presente na minha vida, pura criação e invenção de viver. Produzi bons encontros a partir da (des)coberta, de aberturas, que não somente as dos meus olhos, mas dos meus sentidos e desejo de me tornar livre. Minha sensação era presente e compasso do meu corpo, meu calor e meu sorriso tornaram-se linhas de fuga, desenharam e coloriram outros rostos, eu me inventei e aceitei fazer parte da vida daqueles que generosamente construíam parte da minha realidade, como uma espécie de plano de fuga, rota ou caminho para fugir da cadeia, do encadeamento de marasmo que eu estava. Eu percorri o caminho do acaso, quebrando tudo, muitas vezes até a mim mesmo, mas sem deixar de me conhecer, de me olhar e de me cuidar.
Hoje, ainda sinto que estou (re) começando e feliz por me tornar ato. Sigo aprendendo sem me prender aos medos de mudança, vivendo com o medo como um aliado, vivendo com a dor mas nunca mais calado. Mantenho meu peso de maneira que ele seja suportável, sustentável, que minha existência não seja leve a ponto de não ter chão, mas que eu tenha condição de voar e seguir em frente. E você, o que te faz seguir em frente?